Uma professora em espiral
- Cláudia Júlio
- 8 de jun. de 2021
- 2 min de leitura

Trabalhar em home office. Nome tão chique para a esculhambação que virou a minha vida. Sou professora de Língua Portuguesa. Trabalho em casa mesmo, sem escritório. No computador, no celular, na pia, no fogão, na máquina de lavar.
Não tenho mais uma rotina. Às vezes, me sinto tonta, perdida, rodando sem sair do lugar. Exausta, mesmo achando que ainda estou devendo muita coisa para alguém. Deus! Quantas vezes por semana preciso lavar o banheiro?
Sou desorganizada, admito. Meu pensamento não é linear. Se estou recolhendo o lixo da casa, mas no meio do caminho vejo o balaio cheio de roupas sujas, mudo o rumo e me perco! Melhor respirar fundo, há mensagens da escola no celular.
Outro dia, um aluno não pôde me atender. Estava ocupadíssimo trabalhando. Acho que o estava atrapalhando. Eu me senti envergonhada. Não podia me mandar a atividade, mas me mandou uma foto do local onde estava. Por quê, Senhor? Conversei com ele apressadamente, tirei minhas dúvidas, mas não me segurei. Tive de perguntar por que ele estava no meio de tantos paletes. Esqueci-me de dizer (eu acho): sou professora. Não gosto de glitter ou de EVA. Gosto de palete. Sou a rainha dos paletes. Já roubei palete (sem querer e sem saber) na rua para levar para a escola, com a cumplicidade do marido.
São apenas ripas de madeira, você pode pensar! Não importa! Fico logo imaginando o que aquilo poderia vir a ser. Mas não sou artesã nem prendada. Tenho só as ideias. Sou professora.
O aluno prometeu que o pai iria me ceder alguns, sem cobrar, e traria até minha casa. Achei estranho, porque não pediu meu endereço, mas agradeci a gentileza. Nunca mais entrou em contato comigo.
Acho que se esqueceu! Compreendo! Também ando esquecida! Mas a promessa dele, vez por outra, emerge do meu subconsciente, invade meus pensamentos e sinto um lampejo de esperança!
Um dia, talvez, ele ligue! Ou quem sabe a gente logo se veja na escola! Não terei coragem de pedir, mas ele, provavelmente, ficará constrangido com meu olhar.
Por enquanto, estou aqui e ali. On-line. O tempo todo. Em salas virtuais, participando de reuniões, formações, lives. Enfim...
E o que era regra não virou exceção. Acabei de queimar o arroz!
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